sexta-feira, 19 de junho de 2009

Intervenção


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Eles desceram do céu no início da noite. O vento angustiante que assolara as pastagens durante todo o dia bem parecia uma prenúncio da desgraça. As crianças pararam de brincar, mulheres recolhiam suas roupas, cães encolhiam suas orelhas e procuravam um lugar para se esconder. Estranhos estrondos ecoavam entre as montanhas; sobre as nuvens do entardecer tremeluziam cintilâncias matizadas de tons quentes; os cânticos dos pássaros, estes mais pareciam lamentações.

Todavia a noite iniciara iluminada - irregularmente. Estranhas bolas de plasma luminoso sulcavam o firmamento, desciam num vôo rasante e mostravam suas faces aos pobres amedrontados.

Do alto do penhasco que sobressaía da serra à qual o vilarejo agora pedia panteística proteção, os nômades limitavam-se a olhar, não compreendendo aquele espetáculo dantesco. Quando acordaram para a necessidade de fugir, intempestivamente correram em direção aos bosques. Não tiveram chance alguma: eram meros mortais.

Junto à entrada da cidade, estavam elas lá, as tropas assassinas que agora se faziam revelar. Corcéis cibernéticos, a artificial melena fantasmagoricamente branca a contrastar com a negra paisagem de fundo; assentados sobre estes, os impositores, a princípio imóveis em suas armaduras, ao primeiro grito de comando saltaram sobre a comunidade indefesa.

Ao golpe terrível das espadas luminosas, corpos frágeis ou fortes jaziam em seu próprio sangue.

Entre a multidão de desorientados, destacava-se uma jovem mulher, que, carregando seu pequeno filho nos braços, agilmente esquivava-se dos relâmpagos e das explosões, tentando encontrar abrigo entre os escombros. Vendo a inviabilidade de continuar assim procedendo, deteve-se junto à residência ainda intacta de sua irmã. Encontrou-a na varanda, em frenesi.

– Toma meu bebê, guarda-o contigo em tua morada, é possível que eles não mais venham aqui para assolar-te.

– Não te recusarei o pedido, mas, como podes estar certa de haver aqui segurança para teu filho?

– Ora, que interesse teriam os impositores em demorar-se para saquear pobres camponesas? Creio que ainda esta noite... (de súbito, uma explosão estremece a terra ao redor) Oh! Não podemos mais continuar aqui! Preciso encontrar um lugar para meu filho!

Entre as árvores entreviam-se ágeis centelhas: os cavaleiros e suas espadas mortíferas se aproximavam. A jovem mãe, tomando o bebê dos braços da irmã, correu com ele rumo ao centro desolado onde sua casa se situava. Sentia como se corresse por toda a eternidade.

Qual não foi o seu horror, quando, ao chegar junto à entrada da praça principal, deparou-se com a figura do próprio líder da Legião Impositora, ali postado em todo o seu esplendor mefistofélico. De seu capacete, alongado e rubro, despontava um ornamento brilhante, semelhante a uma formação de pequenas pedras; sua armadura reluzia como ouro. Vendo sua nova vítima, descobriu o rosto.

Numa atitude aparentemente insensata, a mulher correu para ele e, sem jamais largar o filho, ajoelhou-se exasperada.

– Vos suplico, em nome de vossa grandeza, que poupeis esta criança e sua pobre mãe!...

– Admitis a superioridade da Doutrina Intervencionista e a origem divina da Lei Pentagonal?

– Admito, creio, professo o que quiserdes, mas poupai-nos!

Num só golpe de espada, a mulher cai. Abaixo dela, a terra escurece.

– Fraca de espírito!

Desce do cavalo e ergue a criança. Levando-a consigo, monta. Um esgar se desenha em seu rosto de pedra.

– Não chores, pequenino – a voz cavernosa mesmeriza a criatura, que se cala –, não chores. Ainda tens muito a aprender...



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