quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Planeta de Exílio


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O silvo do transe pudoroso ainda paira sobre as construções e as plantações. A criança baixa sua testa em consideração à sua última e esfarrapada esperança de sorrir. Consolos melindrosos ainda a sorrir nos cruzamentos dos caminhos sinuosos. Bem alto, no nível das nuvens, abrem-se portas invisíveis para que caiam os alívios derretedores de argumentos. E caem.

“Maldito ciclone” – rouquejamos. Sua cor única é o emblema da circunscrição única. Nossos braços estão impedidos de abraçar. As canções já emudecidas; campos inacessíveis pelas cercas ácidas. Pálidas são as vestes sacerdotais dos geniosos ministros infernais. Mas ainda pagamos pelas preces, mesmo sem o saber – ainda ajoelhamos na armadilha armamental. Sempre, sempre na espera de um amanhecer nostálgico, subterrâneo, que nos quebre os elos fatais.

Nem as águas que desabam chegam a nos curar. Nossas feridas, já tragadas pela umidade, decoram festivas as estradas da iniqüidade.

Nossos olhares – ah! Quem me dera não mais lembrar dos termos da promessa imposta! Este vínculo politicamentosamente inamovível que nos cinge de dor... e a dor... impossível de ser descrita porque é GRITO e lamento inútil de se tentar traduzir...

Cante ao espaço pútrido, exclame pela salvação, meu único amigo – pode dar certo desta vez. Tem que ser certo, certeza de vida vivida; sim, agora!

Agora os resíduos tecnológicos cobrem a exclamação.

Vastos esteios de domínio recobertos pelo assombroso arsenal: nossa despedida. Nossas idas melancólicas, silentes, evanescidas... Para a distância mais erma e oposta ao conceito acolhedor... Longe, longes sentimos e sonhamos nossos sonhos sem paz, dilaceradas lágrimas!

Sim, vez ou outra alguma estrela cai do céu. Mas sabemos se tratar apenas de rochedos, ou coisas menores ainda – partículas insignificantes de esperança objetivada. Nada que mude o enredo básico. Sonhamos ainda com uma libertação criativa, realmente emocionante – não com fugas ilusórias! Não queremos mais máquinas artificiosas para enxugar nosso pranto – precisamos, isto sim, é que este seja derramado por uma causa digna!

Digno! Digno, brilhe como outrora!; conte-nos novamente aquelas histórias preciosas – precisas! – de revoluções previstas por profetas filosóficos, imponentes no retrato!... Revoadas mecan

Corte. Sempre há alguém caminhando sozinho debaixo da chuva. E, quando nos apercebemos disso, é quase sempre certo que somos nós. Ou seremos. (“Os próximos”.)

Sozinhos – evidentemente.



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Planeta Deserto


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Estranhas ações e reações eólicas. Solitários pedimos maiores informações aos solitários ainda mais desinformados. O céu pesa; sentimos o sarcasmo da carícia. Rigidez, mesmo entre tantas volições.

Cantando para abafar a derrota pronunciada pelos elementos... desaparecidos – nós! – após a tormenta definitiva, aquela que derramou sua benção de vento, água e pedras de gelo gigantescas sobre o até então feérico cenário. A desolação atual – você a conhece bem. Fugia dela e a encontrava de cócoras no refúgio. Nas ruas de terra. Nas rodas-gigantes. Engrenagens de carrossel – lembra daquele tempo? Pois é, está morto.

Mas ainda continuamos. Até quando? Até quando a derrota estampada nos rostos, matando por prazer, furtando por vocação? Lutas mal-calculadas, vigorosamente precipitadas sobre nós e eles. Mas agora eles gostam; já se acostumaram a morder e a arrancar pedaços: o saboroso espetáculo da dor.

De novo? Ah, não... não há quem suporte percorrer este trajeto desolado vezes e vezes seguidas. Nossas vidas estão perdidas. Caldeirões, caldeiradas substanciosas bem puderam nos revigorar nos velhos tempos das velhas campanhas promocionais bairristas e nacionalistas. Mas agora bairros e nações já estão explodidos; nem cinzas deixaram, e, de qualquer forma, é o cúmulo da auto-aflição guardar as cinzas do ente amado.

Pois bem: amamos demais sem nos dar conta da projeção mental estereotipada plasmante da realidade. E é por isso que agora estamos aqui, vagando sob o sol escaldante, sempre em busca de água, sempre chorando nossas últimas gotas de angústia estética. Pura derrota, clara e visível, inegável. Queremos voltar a cabeça, argumentar com o sol. Mas ele não pode falar, evidentemente. É rígida a realidade. Carcomida, sim, mas rígida de opressivas manias assassinas. Tudo isso, tudo aquilo se derramando sobre nós – ainda, ainda, ainda...

“Nós”, eu disse? Mas quem? Só há uma pessoa aqui, cantando sua bela insanidade para o nada absorvedor. Absorvendo o cenário tristemente; lendo mapas coloridos e cheios de símbolos, mas que nada dizem. Desorientação. Desnorteamento. Absoluta, total e interna solidão.

As lembranças como verdugos impassíveis. Mas, e o afago? A Força do universo?

É o Planeta Deserto. Futuro do presente, já presente. Então fujamos – viver ainda é a meta.

Isto é, fujo.

Eu, liricamente.



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